Estado interno / Ambiente - Enquadre (set - setting)




A primeira grande correlação e estrutura necessária para uma experiência segura envolvendo uma substância psicoativa com características 'psicodélicas' está no estado emocional / afetivo / subjetivo no dia ou momento da experiência, e também o local onde será vivenciada (setting). O agenciamento atento envolvendo esses dois fatores é a base da segurança nessas investigações; no entanto, com a ayahuasca alguns critérios mudam pois não se trata de uma experiência 'lisérgica' no sentido de uma ativação sensorial extrema ou de uma transfiguração da realidade em cores e formas com a dinâmica corporal ativa e estável como ocorre com a psilocibina e com o LSD-25 nos picos da experiência. Com ayahuasca não ocorre despersonalização e sim estados visionários e uma catarse consciente, séria, envolvendo autocompreensão sem mecanismo de defesa.

A ayahuasca é uma experiência de sutilização extracorpórea, de uma acentuada leveza e visões que se passam internamente. A atividade corporal  nesses momentos é naturalmente mínima; como uma viagem lúcida onde o corpo se torna etéreo. Isso faz da experiência algo cerimonial e profundamente investigativa; o setting ou local, cultura, simbologia, condução e espaço vivencial são extremamente mais importantes que o estado emocional / subjetivo do momento. Por essa razão a ayahuasca é um instrumento impecável para o processo terapêutico e psicoespiritual. Mesmo estando mal internamente, passando por embates ou questões emocionais sérias ela atua diretamente como mecanismo de purga (limpeza) e ajustes em todo o sistema, fazendo com que o corpo esteja entregue a essa ação; leve e 'aberto' a uma imobilidade natural e propícia ao estado meditativo.

A lisergia, que também possui características de introspecção profunda e visionária navega em outra instância de ativação. Um estado emocional  desagradável ou complicações prévias podem ser vivenciadas sob a ampliação desse outro tipo de ativação, como um adentrar por completo no "terrorifico da cena ou das aversoes e medos" caracterizando a "viagem ruim" das experiências psicodélicas.

A ayahuasca não pode ser retirada do campo das substâncias que dependem de um estado pessoal e contexto adequados, mas são mecanismos diferentes de preparo, de trabalho e de travessia; são escolas diferentes. A ayahuasca é materna e uma tecnologia terapêutica completa por essa característica: de autorregulação ou de pureza e ajustamento dentro de qualquer circunstância pessoal prévia, sendo medicina, de fato.

Bruno Fontoura


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